Perdoar é o movimento de Deus que nos permite restaurar nossa identidade de filhos d’Ele. Seu amor misericordioso culmina no perdão, e é nessa realidade que se fundamenta todo o cristianismo. Jesus morreu numa cruz por todo pecado humano, e por isso o Pai nos perdoa todas as vezes que ferimos seu coração. Sem o perdão, estaríamos condenados. Sem o perdão, não poderíamos voltar à nossa própria casa como fez o filho pródigo. Se Deus, Rei do universo e Senhor de todas as coisas, perdoa cada ser humano que se arrependa de cometer um ato contra Seu amor, então nós humanos também somos capazes de perdoar os nossos irmãos.
A maioria das pessoas encontra muita dificuldade em perdoar aqueles que um dia a feriram, mas quando se entende que perdoar está longe de significar esquecer, a chave vira. Talvez nunca de fato esqueçamos uma situação ruim que alguém tenha nos causado, mas isso não significa que não somos capazes de tirar a culpa dessa pessoa. Perdoar é, na verdade, permitir que aquela pessoa ou situação cometida não moldem mais seus comportamentos e atitudes. É não se permitir ser conduzido e gerado pela ferida ou mágoa, mas olhar além dela.
“Antes, sede uns com os outros bondosos e compassivos. Perdoai-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou, em Cristo.” (Ef 4, 32).
Perdoar como caridade
Eu não sei o quanto te parece injusto retirar a culpa de um irmão que te feriu. Mas por acaso era justo que o Filho de Deus morresse pela humanidade de um modo tão cruel? Por acaso é justo que o Senhor perdoe todas as suas faltas mesmo sabendo que você irá cometê-las novamente? Nem sempre os desejos de Deus são justos aos olhos do homem, e é por isso que perdoar se torna um grande ato de caridade e amor.
Ainda que seu irmão não mereça o perdão, você o dá. Ainda que ele sequer tenha pedido o seu perdão, você o entrega. E ainda que isso não faça diferença alguma na vida dele, com toda certeza fará na sua. Porque um coração generoso no perdoar receberá a generosidade de Deus para ser perdoado. “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia!” (Mt 5, 7).
Perdoar para liberdade
Toda vez que alguém te marca, seja positiva ou negativamente, algo muda dentro do seu coração e essa impressão pode ficar lá por muito tempo. Quando a impressão é negativa e gera traumas, mágoas ou inseguranças, somos nós que sofremos muito mais do que a pessoa que nos feriu. Por isso, perdoar é um passo de liberdade da nossa própria alma.
O primeiro passo para ordenarmos nossa história e nossos afetos para o amor e a alegria é através do perdão. A falta de perdão a Deus extermina a memória de fé, a falta de perdão a si mesmo elimina a memória da esperança, e a falta de perdão ao próximo elimina a memória do amor. A falta de perdão, portanto, causa um dano muito maior que o trauma em si na nossa alma, e sem ele não podemos ser livres como Deus nos criou para ser. (Fio de Ouro, parte I, capítulo X).
O primeiro passo para perdoar alguém é nos reconhecer como necessitados de perdão em primeiro lugar. Somos seres falhos, miseráveis, cheios de erros e que um dia estaremos na posição de precisar de redenção, se não neste mundo, ao entrar na vida eterna. Ao nos reconhecer miseráveis e necessitados de misericórdia, podemos ter misericórdia para com os irmãos.
Não é fácil trilhar esse caminho, e não pense que perdoar acontece do dia para noite. É um processo, que com a graça de Deus torna-se mais leve e mais fácil. Lembre-se sempre de que você precisa perdoar a pessoa, e não o erro. Não é possível diminuir ou anular a gravidade de um erro, e não é isso que o perdão busca. Perdoar é sempre sobre alguém, alguém que sem dúvida alguma também é um filho amado de Deus assim como você e que, ainda que não busque ser santo ou sequer se arrependa de seus atos, necessita de amor.
Giovana Cardoso
Discípula da Comunidade Católica Pantokrator